sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Se alguém perguntar....

Se alguém me perguntar, hei-de dizer que sim, que foi
verdade - que não amei ninguém depois de ti nem
o meu corpo procurou nunca mais outro incêndio
que não fosse a memória de um instante junto
do teu corpo; e que deixei de ler quando partiste
por não suportar as palavras maiores longe da tua boca;
e que tranquei os livros na despensa e tranquei a despensa,
acreditando que, se não me alimentasse, acabaria
por sofrer de uma doença menor do que a saudade, mas
a que os outros, pelo menos, não chamariam loucura.

Se alguém me perguntar, direi que foi assim, e não de
outra maneira, como alguns parecem supor - que permiti,
bem sei, que outros homens me amassem e me aquecessem
a cama, mas em troca lhes dei apenas um nome diferente
do que tinham e os vi partir desesperados a meio
da noite sem sentir maior dor que a de saber que, afinal,
também eles não existiam para além de ti; e que no dia
seguinte dava comigo a trautear sem querer essa canção
que amavas (como se ela, sim, se tivesse deitado
no meu ouvido), mas que a sua melodia, em vez
de me alegrar como antes, me escurecia mais a vida.

Se alguém me perguntar, nada desmentirei, nem negarei
que os frutos todos que me deram a provar na tua ausência
me pareceram demasiado azedos ao pé dos que explodiam
em sumo nos teus lábios; e que, por isso, nunca mais quis
um beijo de ninguém, nem sequer inocente, e não voltei
também a aceitar as flores que me traziam por me lembrar
que, em mãos assim, tão grandes para o afecto, o seu
perfume anunciava invariavelmente a chegada do outono.

E contarei por fim, se alguém quiser saber, que o teu silêncio
foi de tal densidade, de tal espessura, que não consegui
escutar nenhuma das vozes que vieram depois de ti e, pior
do que isso, me esqueci com indiferença das mais antigas,
pelo que as minhas noites se tornaram uma tão longa
e solitária travessia que ainda esta manhã acordei ao lado
da tua sombra e respondi baixinho, mesmo sem ninguém
me perguntar, que há coisas que uma mala nunca leva.


Maria do Rosário Pedreira

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Tu....


Respiro o teu corpo:
sabe a lua-de-água
ao amanhecer,
sabe a cal molhada,
sabe a luz mordida,...

sabe a brisa nua,
ao sangue dos rios,
sabe a rosa louca,
ao cair da noite
sabe a pedra amarga,
sabe à minha boca.

Eugénio de Andrade

domingo, 22 de dezembro de 2013

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Amar....



"Quando se ama, naquele exacto segundo em que se ama, tem de se acreditar que é para sempre. Mais: tem de se ter a certeza de que é para sempre. Amar, mesmo que por segundos, mesmo que por instantes, é para sempre. E é isso, essa sensação de segundos ou de minutos ou de dias ou de horas ou de anos ou meses, que é para sempre. Ama. Ama por inteiro. Ama sem nada pelo meio. Ama, ama, ama, ama. Ama. Porque é só por aquilo que te faz perder a respiração que vale a pena respirar."
Pedro Chagas Freitas

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Sem ti

" É um fardo aos ombros
o corpo, sem ti.
Até o amarelo
dos girassóis se tornou cruel.
Não invento nada,...

na arte de olhar
a luz é cúmplice da pele. "

Eugénio de Andrade

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Abraça-me......




Abraça-me. Quero ouvir o vento que vem da tua pele, e ver o sol nascer do intenso calor dos nossos corpos. Quando me perfumo assim, em ti, nada existe a não ser este relâmpago feliz, esta maçã azul que foi colhida na palidez de todos os caminhos, e que ambos mordemos para provar o sabor que tem a carne incandescente das estrelas. Abraça-me. Veste o meu corpo de ti, para que em ti eu possa buscar o sentido dos sentidos, o sentido da vida. Procura-me com os teus antigos braços de criança, para desamarrar em mim a eternidade, essa soma formidável de todos os momentos livres que a um e a outro pertenceram. Abraça-me. Quero morrer de ti em mim, espantado de amor. Dá-me a beber, antes, a água dos teus beijos, para que possa levá-la comigo e oferecê-la aos astros pequeninos.
Só essa água fará reconhecer o mais profundo, o mais intenso amor do universo, e eu quero que delem fiquem a saber até as estrelas mais antigas e brilhantes.
Abraça-me. Uma vez só. Uma vez mais.
Uma vez que nem sei se tu existes. 


Joaquim Pessoa

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Ama....




"Se amas: sê fácil. Abre os braços, abre as pernas, abre a boca: abre-te para quem amas. Se amas: não compliques. Se queres um beijo, beija; se queres um abraço, abraça; se queres um orgasmo, despe e salta e dança e sua e geme. Se queres amar: ama. Não olhes a convenções. Prefere as pulsões."